Qual o segredo da única grande empresa alagoana de capital público-privado que dá lucro?

Agendaa 16 de abril de 2018

por Rodrigo Cavalcante

A ascensão e morte do Produban. A decadência da antiga Ceal (uma das poucas distribuidoras de energia do Nordeste não privatizadas em meio a um impasse com o Governo Federal). A crise e os passivos acumulados pela Casal (que tenta se reerguer agora a duras penas).

Para o alagoano que assistiu aos capítulos da série de ascensão e falência de organizações de capital público e privado (chamadas sociedades de economia mista, principalmente as que detêm monopólio dos serviços), difícil acreditar em outro desfecho para elas além de loteamento de cargos, ineficiência na prestação de serviços, balanços negativos, corrupção – ou todas as alternativas.

Como explicar, então, o caso da Algás, empresa de comercialização e distribuição de gás natural de Alagoas que completa 25 anos este ano relativamente blindada dos efeitos acima com uma gestão que consegue ser rentável, gerar dividendos aos acionistas e ainda ter capacidade para investir em obras públicas importantes, como o gasoduto Penedo-Arapiraca, inaugurado este mês com investimento de R$ 36 milhões?

“Acredito que um dos segredos da gestão bem sucedida da Algás esteja no modelo equilibrado de governança da empresa”, diz o carioca George Santoro, secretário da Fazenda do Estado e Conselheiro da empresa que conhece de perto outras companhias de capital misto no seu Estado natal e em outras regiões.

Mas, afinal, que modelo é esse?

Diferentemente da maioria das sociedades de economia mista (onde o Estado tem o direito de bater o martelo na posição de acionista majoritário), a Algás segue um acordo de acionistas no qual qualquer decisão estratégica precisa ser tomada com a aprovação de todos os sócios: Estado de Alagoas, Gaspetro (empresa vinculada à Petrobras) e a Mitsui Gás e Energia do Brasil, subsidiária da multinacional japonesa Mitsui, o acionista privado da Algás.

“Na época, nossa principal preocupação era construir um modelo que equilibrasse o poder entre todos os acionistas”, diz o advogado Carlos Méro, primeiro presidente da Algás que foi responsável pelo desenho desse modelo de gestão ainda no governo Geraldo Bulhões, em 1992. “Não queríamos, por exemplo, fragilizar o poder do acionista privado frente aos dois acionistas estatais”.

Na prática, o modelo evita que um governante possa tomar a decisão isolada de tocar um projeto megalomaníaco, por exemplo, que coloque em risco a saúde financeira da empresa. Por outro lado, o modelo de concessão também garante que o parceiro privado não possa ter como foco apenas projetos lucrativos de curto prazo – que não atendam às demandas do interesse público.

Ao menos até aqui, ninguém pode dizer que o modelo da Algás não resistiu a provas de fogo. O acordo não só conseguiu ser aprovado no instável governo Geraldo Bulhões, como sobreviveu ao turbulento e (interrompido) mandato de Divaldo Suruagy (e ao vice que assumiu em seguida Manoel Gomes de Barros), às duas gestões de Ronaldo Lessa (e sua constante troca de cadeiras chamada “ronaldízio”), aos dois mandatos do tucano Téo Vilela até, enfim, ser preservado pelo atual governo Renan Filho, que indicou para presidir a empresa o professor de economia da Ufal e ex-secretário de Desenvolvimento de Estado Arnóbio Cavalcanti.

“Acredito que a inteligência do contrato de concessão, o modelo de governança e outros instrumentos de controle interno de gestão são, sim, fatores decisivos para que a Algás tenha mantido seu ciclo virtuoso nos últimos 25 anos”, diz Arnóbio. “Mas é preciso também dar crédito aos gestores que deixaram sua marca na cultura da empresa e ao apoio do atual governo do Estado, que nos pressiona positivamente para acelerar projetos com foco no desenvolvimento de Alagoas, como é o caso do gasoduto Penedo-Arapiraca”.

O próprio Arnóbio, que já foi conselheiro da Algás no início dos anos 2000, ainda como secretário estadual de Ronaldo Lessa, não hesitou em convocar de volta à empresa um ex-presidente da companhia por quase oito anos, o engenheiro Gerson Fonseca, atual assessor da presidência – num raro gesto de desprendimento contrário à mania local de descontinuidade de boas práticas administrativas em função de vaidade política.

O resultado é que, em um momento de polarização e pobreza de debate entre os que demonizam o mercado e os que demonizam o Estado, a Algás prova que, na prática, o fator mais decisivo para a blindagem e sucesso de uma empresa de capital público-privado não está em querelas ideológicas – mas em um desenho inteligente de gestão que saiba tirar melhor proveito da tensão dos interesses de cada acionista.

Resta saber agora se o modelo, que foi adotado inclusive como referência até por outras empresas de gás no país, poderá ser replicado com sucesso em outras companhias de capital misto no Estado.

 

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